A presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Dani Monteiro, comparou a Operação Contenção, que já contabiliza119mortos, ao massacre do Carandiru.

“Se esses dados se confirmarem, tem uma violação maior que o Carandiru. Então, se torna a maior violação cometida pelo Estado na história da nossa redemocratização”, declarou Dani,nesta quarta-feira (29), duranteatendimento da comissão para acompanhar os desdobramentos da ação policial nos complexos do Alemão e da Penha, em parceria com diversas instituições.
A parlamentar explicou que, de acordo com a ciência, ações que resultam em mais deseis mortos podem ser consideradaschacinas.
O Massacre do Carandiruocorreu em 2 de outubro de 1992, quando uma intervenção da Polícia Militar do estado de São Paulo, visando conter uma rebelião na Casa de Detenção de São Paulo (Carandiru), causou a morte de 111 detentos.
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A parlamentar destacou que a Organização das Nações Unidas (ONU) pediu esclarecimentos ao Estado brasileiro sobre a megaoperação no Rio de Janeiro. “[O governo brasileiro] tem um longo lastro de julgamentos e condenações por violações de direitos humanos, exatamente em operações como a que ocorreu ontem” comentou.
Um dia de guerra
Moradores do Rio de Janeiro viveram momentos de pânico e medo na terça-feira (28) diante da operação policialnos Complexos da Penha e do Alemão. Milhares enfrentaram dificuldades paraconseguir chegar em casadevido aosbloqueios das vias da cidade, além deterem de fugir dostiroteios.
Especialistas ouvidos pelaAgência Brasilcriticaram a açãoque gerou um grande impacto na capital fluminense e não atingiu o objetivo de conter o crime organizado. Para aprofessora do Departamento de Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense (UFF), Jacqueline Muniz,a operação foi amadora euma “lambança político-operacional”.
Movimentos populares e de favelas também condenaram as ações policiais eafirmaram que “segurança não se faz com sangue”.
Hoje pela manhã (29), ativistas que acompanharam aretirada de mais de 60 corposde uma área de mata no Complexo do Penhaclassificaram a ação policial como um “massacre”.
Investigação prévia
A presidente da comissãoafirmou que operações policiais, como a efetuada ontem, deveriamser precedidas de uma investigação para que se possa dizer se as pessoas mortas eram de fato envolvidas com o crime organizado.
“O mínimo que a gente deveria era já ter essa investigação prévia atestando que aquelas pessoas eram envolvidas no crime organizado do território”.
A deputada acrescentou que se os policiais usassem câmeras corporais seria possível confirmar uma reação violenta da parte dos traficantes, o que justificaria o uso escalonado da força policial. “Esses dois elementos que eu trago, que são as câmeras corporais e a investigação prévia, não ocorreram.”
Dani Monteiro está no Complexo da Penha onde acompanhao deslocamento dos familiares e dos corpos. “Para ter, minimamente, a autópsiados corpos e que a gente comece a fazer investigação se todos essas pessoas mortas tinham mandados de busca pela polícia, já tinham investigações criminais. O que a polícia conseguiu reconstruir da vida delas que confirmasse esse envolvimento com o crime organizado?”. Para a deputada, o que há são especulações.
A parlamentar avaliaque o governador não tem como confirmar o que tem dito à mídia, que todos os mortos eram envolvidos com o tráfico. “É uma violação dos direitos humanos. Mas, hoje, o que ele fala é leviano. Ele não tem essa confirmação”.
O governador do estado, Claudio Castro, tem defendido a ação das forças policiais. Segundo ele,aOperação Contençãofoi um “sucesso”eas únicas vítimas dos confrontos foram os policiais mortos.
Suporte
Equipes da Comissão de Direitos Humanos estão dando suporte aos familiares dos mortos. Dani Monteiro informou que não há executivos do governo do estado na favela. Quem está tirando os corpos da mata e dos becos e levando para o Instituto Médico-Legal (IML) são os moradoreslocais. A presidente da comissão ressalta a importância deque seja feita perícia no local, exame de balística.
Nessa terça-feira (28), a comissão oficiou o Ministério Público do Estado, a Polícia Civil, a Polícia Militar e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), responsável pelo comitê de monitoramento da ADPF 635, solicitando informações urgentes sobre o planejamento, a execução e as responsabilidades pela ação. O documento pede ainda especial atenção ao uso da força no contexto da operação.
“Oque vimos no Alemão e na Penha é o retrato de um Estado que perdeu qualquer limite”, disse a presidente da comissão, em nota divulgada na manhã desta quarta-feira.
“Virar a madrugada contando corpos não pode ser rotina de um Estado de Direito sem pena de morte. O Rio precisa de justiça, não de chacinas eleitoreiras fantasiadas de operação policial”, completou a nota.
A Comissão de Direitos Humanos manifestou também solidariedade aos familiares dos policiais mortos, reafirmando que todas as vidas importam e que a violência não pode ser política pública de governo.
